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Romances de Estância e Querência – Aureliano de Figueiredo

821.134.3(816.5)-31 / P659r Exemplares: 01

Aqui está, finalmente, o livro que reúne a poesia gauchesca de Aureliano de Figueiredo Pinto. Durante muitos anos se falou nesse estranho intelectual, doublé de médico e homem de letras, arredio às rodas literárias, a viver discretamente numa pequena cidade do interior, na prática de sua profissão – em que adquiriu notável renome – e no exercício desinteressado das coisas do espírito.

Muitos dos poemas que o público vai agora conhecer foram escritos há vários anos. O autor, porém, sempre se recusou a dar-lhes publicidade. Só ultimamente, a instância de amigos, é que Aureliano de Figueiredo Pinto consentiu em publicar alguns deles em jornais de Porto Alegre, mas, mesmo assim, sob o disfarce de pseudônimos diversos. Nele, o pudor de aparecer em letra de forma é quase invencível. Foi uma luta, por exemplo, convencê-lo de que seu nome deveria figurar no presente volume, em lugar do pseudônimo que já havia escolhido.

– “Sou médico – diz ele. – A poesia para mim é apenas uma fuga a que empresto uma significação puramente subjetiva. Se os amigos querem realmente subjetiva. Se os amigos querem realmente conhecer alguns de meus poemas, é só pedirem, que lhes remeto uma cópia…” Era esta a desculpa invariável que o autor apresentava a todos que lhe surgiam a publicação de seus poemas.

Mas a insistência daqueles que o conhecem e com ele conviveram, terminou por faze-lo aceitar a ideia de ver os seus poemas enfeixados em livro.

Sobre o médico Aureliano de Figueiredo Pinto temos o depoimento de um eminente professor da Universidade do Rio Grande do Sul: “Devia estar lecionando na Faculdade de Medicina, tais as suas excepcionais qualidade de inteligência e cultura. É uma figura que honra o Rio Grande!”.

Sobre o poeta, depõe, entre outros, Athos Damasceno Ferreira: “Aureliano de Figueiredo Pinto é um dos mais autênticos regionalistas do Rio Grande. Pena é que apareça tão tarde, quando o gênero se apresenta depreciado por tantas contra facções. Tivesse surgido na época própria – em que, aliás, já tinha ótimos poemas escondidos na gaveta – e hoje estaria ocupando um lugar de primeiro plano no regionalismo gaúcho. De qualquer modo, seu livro vai exigir uma revisão de valores para abrir o lugar que lhe cabe de direito na história da poesia regional sul-rio-grandense.”

Nada, nos seus versos, do apenas fácil e pitoresco que caracteriza uma boa parte da poesia gauchesca. A poesia de Aureliano de Figueiredo Pinto, profundamente ligada à terra, tem uma extraordinária densidade humana, assumindo sua temática, em muitos passos, o sentido de um canto geral que transcendente o mero regionalismo. Poucos livros refletem com mais autenticidade o homem e a paisagem do Rio Grande do que estes “Romances de Estância e Querência”.

Lê-los, é sentir a força telúrica do pago, é ouvir a voz do gaúcho andarengo perdida nas coxilhas do tempo, é ouvir palpitar o próprio coração da querência em versos nostálgicos, de grave e severa beleza, versos que Aureliano de Figueiredo Pinto compôs.

com chuva e vagar

sem pressas no romaneio.

E porque trabalhou assim, com vagar e sem pressa, seus poemas vão ficar porque são o testemunho de quem muito amou e compreendeu o Rio Grande nas suas manifestações mais simples e mais autênticas.

Aureliano de Figueiredo Pinto

Aureliano de Figueiredo Pinto é reconhecidamente um dos mais representativos poetas gauchescos do Rio Grande do Sul. À exceção de um belo artigo do passo-fundense Hilton Luiz Araldi pouco mais se encontra sobre a vida do autor de “Romances de Estância e Querência”.
Poeta e romancista, nasceu na Estância São Domingos, município de Tupanciretã, no primeiro dia de agosto de 1898, filho de Domingos José Pinto e Marfisa de Figueiredo Pinto. Alfabetizado em casa, pela própria mãe, partiu para Santa Maria, em 1908, onde cursou o ginásio. Publicou os primeiros poemas em 1914, na revista “Reação”, de Santa Maria. Dois anos depois se transferiu para Porto Alegre, preparando-se para cursar Direito, mas optou pela Medicina. Introspectivo, recebeu o apelido de “O Corujão”.
Em 1918 divulga novos poemas em revistas e no “Correio do Povo”. No ano seguinte envia ao amigo Antero Marques o poema “Toada de Ronda”, que introduz o “nativismo de feição moderna” em nosso Estado. Assim, insere a literatura rio-grandense num amplo movimento de renovação da gauchesca iniciado no Uruguai. O poema, em sua forma definitiva, seria publicado em “Romances de Estância e Querência – Marcas do Tempo”.
Trata-se de um movimento que tem suas origens na revista “El Fogón”. “Em setembro de 1895 – escreve o professor Daniel Vidart – um conjunto de entusiastas burgueses montevideanos funda a Revista ‘El Fogón’ para fazerem brilhar nela suas fagulhas poéticas. Isto não era um fato isolado. Depois da consagração do ‘Martín Fierro’, de José Hernández, que superou em qualidade e riqueza ao seu modelo ‘Los tres gauchos orientales’, de Lussich – ambos editados em 1872 – havia florescido em ambas as margens do Prata uma subliteratura gauchesca, forjada ao paladar de um ávido público consumidor. Esta produção, comumente de ínfima qualidade, arrastou, durante uns vinte anos, à decadência um gênero que nasceu como um testemunho e culminou como uma evocação. Os abortos teatrais brotados a esse amontoado inauguraram a luz dos holofotes do picadeiro circense um incessante pulular de dramalhões – puro talho, punhalada e chorar de chinas e nazarenas – que satisfaziam as exigências dos litorâneos nostálgicos do campo distante. Por seu lado, as produções poéticas – de algum modo tem de chamá-las – circularam de mão em mão muito mal impressos em livrinhos, folhetins e folhas soltas que eram lidas aos tropeços pelos leitores nas penumbras dos bolichos ou dos ranchos suburbanos e paupérrimos enquanto um auditório analfabeto procurava reconhecer, atrás dos afetamentos e deformações, o distante sistema de sinais de uma realidade afundada para sempre. Os agitados pelo êxodo rural, sobreviventes de uma sociedade que substituído a existência periférica do gaúcho pela igualmente marginal do povinho de ‘ratos’ ou a ‘vila-miséria’, se encontravam elegiacamente com um paraíso perdido, convertido em mito, habitada por uma turba de fantasmas melenudos que combatiam com a força prepotente e bêbada, representante do governo, aliada com os estancieiros e protegida pelos comerciantes e, por isso, sempre vencedora”.

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