12 de fevereiro de 2004. Primeiro dia de aula. As mais belas borboletas reviravam o estômago. Uma mistura de sentimentos bons ferviam no peito. Materiais, tudo em dia. Roupa escolhida. Entrei no ônibus e pela janela fiquei imaginando as pessoas que eu encontraria e as amizades que fariam parte da minha vida. Na minha cabeça, tinha tudo sob controle e seria um dos melhores dias da minha vida… Mas mal sabia eu que naquele dia, estava tudo certo pra dar errado.
Cheguei na escola e fui recebida da melhor forma possível pelas professoras. Na entrada, haviam duas mulheres muito simpáticas que falavam com a gente sorrindo, e faziam com que aquele pingo de nervosismo desaparecesse e ficávamos seguros. Desci até o pátio da escola com minha mãe. Lá estavam todas as outras crianças também. Algumas choravam, outras brincavam, outras já haviam formado panelinhas de amizades, outras não saiam do lado da mãe, e eu observava e pensava que logo eu estaria no meio daquela roda brincando de ciranda também.
O sinal tocou e chegou a hora de me despedir de minha mãe para entrar na sala de aula e finalmente conhecer meus colegas. Dei um abraço apertado nela e ela me disse que daria tudo certo.
Entrei na sala de aula e conheci meus colegas. Eram 15 crianças, além de mim. Eu estava tão feliz, tão empolgada, tão maravilhada, tão confiante, mas meus colegas pareciam estar mais do que eu. Fizemos umas brincadeiras com a professora e depois fomos para o recreio. Quando eu sai da sala de aula, um grupo de meninas passou por mim rindo e dizendo coisas horríveis, como: “nanica”, “feia”, “magrela” e muitas outras coisas. Fiquei bolada, mas continuei meu caminho. Fui para o banheiro e lá estavam elas. Entrei numa cabine para esperar elas saírem de lá. Quando ouvi que as conversas delas desapareceram, resolvi sair, mas infelizmente não foi possível naquele momento. Elas haviam me trancado no banheiro. Que tipo de pessoa em sã consciência faz isso? Trancar uma criança assustada em um banheiro é golpe baixo! Maldade total. Sem contar nas vezes em que elas “compravam” as pessoas para me ignorarem e rirem de mim pelas minhas costas. E quando elas faziam seus grupinhos e panelinhas e me deixavam totalmente só em todos os recreios? É… Parecia tudo normal, tudo brincadeira de criança. Mas foram essas brincadeiras que tornaram minha vida um inferno.
Quando cheguei em casa, decidi não contar pra minha mãe os ocorridos, e apenas falei que tinha sido ótimo. E aquilo era tudo o que ela mais queria ouvir. Tomei banho, jantei e fui para o meu quarto. Senti um aperto no peito e comecei chorar baixinho, pra ninguém ouvir. Meu lema era não mostrar fraqueza na frente das pessoas, nem mesmo dos meus pais. Naquela noite, chorei até pegar no sono. No dia seguinte, minha mãe me chamou para ir pra aula. Resolvi fingir que não tinha escutado. Eu não estava com a mínima vontade de ir pra escola, e todo aquele ânimo do dia anterior desapareceu. Meu peito apertava toda vez que se tocava no assunto “escola”. Fui obrigada a levantar da cama e me arrumar. Fui esperar o ônibus na parada junto com minha mãe, e quando o avistei, corri. Corri como se aquele ônibus fosse um monstro que estava atrás de mim. Minha mãe correu atrás de mim, sem saber o que estava acontecendo. Até que ela me pegou e me colocou dentro do ônibus. Eu chorava e gritava como nunca. Vi o olhar dela tentando entender o que estava acontecendo comigo. E assim foi por uns 40 dias seguidos. Sem ânimo. Sem vontade de ir pra aula. Sem fome. Até que fui encaminhada a uma psicóloga. Foram necessárias 4 sessões até eu ser diagnosticada com ansiedade.
Como é a vida de uma pessoa com ansiedade? Uma droga. As mãos e os pés ficam frios e ao mesmo tempo suados. Às vezes, minhas pernas tremiam. Eu sentia vontade de vomitar, e o meu pensamento não me deixava em paz um segundo se quer. Ficar parada era muito difícil, e controlar o choro, impossível. Daquele dia em diante, minha vida mudou. O compromisso do mês era ir à psiquiatra. Os remédios começaram a fazer parte da minha vida. Era tanto remédio que meu estômago doía toda vez que eu os ingeria. Fiz tratamento por uns 4 anos, até que então, houve um avanço e junto com a psicóloga, decidimos cortar os remédios. Aí fiquei bem por mais uns 3 anos. É sério, me livrar da ansiedade foi a melhor coisa da minha vida. 3 anos vivendo muito bem, 3 anos indo para a escola sem me preocupar com nada. Mas a ansiedade é danada. Ela pode ficar com você um tempo e desaparecer pra sempre, ou ficar pra sempre do teu lado. E no meu caso, parece que estará pra sempre.
Hoje tenho 15 anos. Sou diagnosticada com ansiedade há uns 7 anos. Não preciso mais de remédios, pois foram 7 anos lutando contra e descobrindo cada dia um novo músculo do meu corpo que tremia toda vez que ela chegava. Convivo com ela há 7 anos, e sinceramente, eu já a conheço. Sei o que ela vai me fazer e o que não vai.
A ansiedade em um todo é uma das piores coisas que eu já conheci. Mas existe uma coisa pior do que sentir ansiedade: ser julgada por senti-la. E infelizmente, eu não sou a única que passou por isso. Muitas pessoas que também sofrem com esse transtorno são julgadas. São chamadas de frescas e muitas vezes escutam aquela expressão “falta de laço”. A ansiedade rasga o peito, e as críticas a alma.
O transtorno de ansiedade nos dias de hoje é um dos problemas mais encontrados. Muitas e muitas pessoas sofrem diariamente por sentirem demais. Esse transtorno é um bicho de sete cabeças, mas o que eu tenho pra falar é: por mais grande que esse sentimento seja, a gente é maior que ele. É sério! Quando nos apaixonamos, a paixão bate na porta do coração e a gente abre. A ansiedade não. A ansiedade arromba. Ela entra, faz o café, bagunça a casa inteira e insiste em ficar ali nos atormentando. Mas deixa eu contar um segredo: a gente pode expulsar ela ou, então, sentar e a entender. E foi isso que eu fiz. Eu a compreendi. Atualmente, ela ainda insiste em ser sentida aqui dentro de mim. Mas agora eu a vejo como uma criança mimada e OK, assombrosa, mas eu também me vejo com uma pessoa mais forte. E a vantagem de quem sente muito é ser forte.
Você nunca vai carregar uma cruz que não vai ser possível aguentar. E assim deve ser com os sentimentos. Todas as vezes que a ansiedade apertar, temos que lembrar que se ela tá dentro da gente, é por que temos capacidade de aguentá-la. Se a ansiedade for um bicho de sete cabeças e te derrubar, levanta e mostra que você pode ter oito. Acredite em si. Ela não pode ter domínio sobre você, e depois que você a conhecer mesmo, ela não terá.